sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

Saudades do Lula do ABC (Carlos Chagas)

BRASÍLIA – Eufemismos e malandragens à parte, porque demissões são demissões, jamais “extinção temporária de postos de trabalho”, a pergunta inicial é numérica: quantos trabalhadores foram demitidos no País desde que a crise econômica começou?

Têm sinistros dizendo 600 mil. Pelo jeito é demais, ainda que a meta das megaempresas ultrapasse esse horror. As demissões por conta da crises começaram em novembro, atravessaram dezembro com satânico furor e conseguem superar-se em janeiro, que mal chegou à metade.

Mais do que reconhecer na imprevidência, na incompetência e na ambição especulativa de maus empresários a razão maior das demissões, importa verificar, hoje, o reverso da medalha. Traduzindo: a inoperância, a covardia e a submissão das centrais sindicais e da maioria dos grandes sindicatos diante da sanha dos patrões, que ao primeiro sinal de dificuldade dedicam-se à prática milenar de mandar a conta para os empregados.

Em outros tempos a categoria dos assalariados já estaria na rua, rejeitando as demissões indiscriminadas, as férias coletivas e obrigando as empresas a cumprir contratos e a respeitar os direitos trabalhistas que sobraram de demolições anteriores. Protestos, passeatas, até greve geral seriam o caminho natural para a defesa dos interesses dos trabalhadores. Nessa hipótese, o governo seria obrigado a agir, menos para liberar bilhões para atender bancos e companhias falidas, mais para corrigir as distorções do atual modelo econômico neoliberal que só privilegia o capital, massacrando o trabalho.

Por que não reduzir desde já os polpudos vencimentos e as mordomias da parte ruim do empresariado, bem como extinguir os bônus que essas pequenas quadrilhas se autodistribuem? Por que não proibir demissões enquanto não for utilizado o patrimônio privado dos proprietários, na tentativa de recuperação das empresas? Por que não devassar, multar e punir quantos preferiram especular no mercado financeiro com o capital e os lucros das companhias sob sua direção, em vez de utilizá-los para reforçar as atividades-fim?

A movimentação dos trabalhadores mudaria o processo econômico e até a História, mesmo sem necessidade da releitura de Marx. Dentro das regras do capitalismo, que adotamos, mas à margem da selvageria prevalente há décadas. Afinal, os assalariados agora condenados às profundezas constituem ampla maioria. São eles que votam às vezes enganados, já que o governo dos trabalhadores, noves fora o Bolsa-Família, transformou-se no governo dos banqueiros.

Não há, porém, que desviar do sentido principal deste comentário: tudo acontece pela incúria e a inépcia dos dirigentes sindicais, salvo raras exceções. CUT, Força Sindical e penduricalhos já aceitam a flexibilização das prerrogativas sociais, a suspensão de contratos de trabalho, a redução da jornada de trabalho e dos salários. Concluem serem as demissões inevitáveis e bajulam as entidades patronais para que suas lideranças sejam preservadas.

Convenhamos, dá saudade dos tempos do Lula do ABC, quando, mesmo enfrentando a ditadura, os trabalhadores ocuparam seu espaço...
Os mesmos nos estados

Não apenas a sucessão presidencial está nas ruas. Nos estados, as disputas pelos governos vão adiantadas. Já se posicionam os pretendentes às indicações partidárias, prevalecendo um denominador comum: os candidatos são os mesmos de sempre, com raras exceções.

Em São Paulo, surge Aloísio Nunes Ferreira, pelos tucanos, ainda que um valor maior possa alevantar-se. Caso o presidente Lula venha a disputar o terceiro mandato, dificilmente José Serra aceitará concorrer à presidência da República para perder. Assim, pleitearia a reeleição, se ela não tiver sido extinta. Do lado do PT, Marta e Eduardo Suplicy tentarão sobrepor-se a Luís Marinho, sem esquecer Antônio Palocci ressuscitado. Paulo Maluf não deverá perder a última oportunidade de disputar uma eleição majoritária, mas Orestes Quércia parece acomodado com o acordo feito com os tucanos para eleger-se numa das duas vagas de senador.

No Rio, disputará a reeleição o governador Sérgio Cabral, caso perca para Geddel Vieira Lima a indicação do PMDB para vice-presidente na chapa de Dilma Rousseff. Fernando Gabeira é uma hipótese para as oposições, que sempre divididas acabarão por apresentar, também, Jandira Feghalli, Lindemberg Farias e outros. O bispo Crivella talvez não tenha desistido.

Em Minas o ex-prefeito Fernando Pimentel e o ministro Patrus Ananias pretendem a indicação do PT, com o ministro Hélio Costa pelo PMDB. Na Bahia, Geddel Vieira Lima sairá candidato do PMDB se não virar companheiro de chapa de Dilma Rousseff, mas o governador Jacques Wagner, do PT, disputará um segundo período. No Rio Grande do Sul, Yedda Cruzius recupera-se em termos de imagem, não deixando de concorrer à reeleição. Corre por fora o senador Paulo Paim, do PT, sem esquecer o ministro Tarso Genro. E Manuela Dávila.

E assim por diante, nos demais estados, onde só como exceção deve surgir candidatos novos, de novas gerações. A menos, é claro, que a crise econômica vire tudo de cabeça para baixo. Até as eleições.
E nós com isso?

Aproxima-se a posse de Barack Obama e a pergunta que mais se ouve no Brasil, entre manifestações de simpatia diante do novo presidente americano é “e nós com isso?” Porque, uma vez mais, não somos prioridade alguma para os irmãos do Norte. Tomara que ele acerte, que recupere a economia dos Estados Unidos e faça esquecer os dois lamentáveis períodos de George W. Bush, mas em termos de relacionamento, parceria ou abertura de novos horizontes entre nós, nada feito. Recebemos, como receberam os demais países do mundo, o conselho para nos fazermos representar na posse de Obama apenas pelo embaixador credenciado em Washington.

Pelo jeito eles não querem presidentes e primeiros-ministros ofuscando a cerimônia, sintoma capaz de dar a medida do que serão os primeiros meses de seu governo, quase exclusivamente voltado para dentro de suas fronteiras. Possivelmente alguma retórica será desenvolvida nos discursos e programas com relação a problemas mundiais, tipo Oriente Médio, Irã, Coréia do Norte e sucedâneos. Como estamos longe, melhor seria seguir o conselho de autor hoje pouquíssimo citado na própria China, o presidente Mao: “Apoio às próprias forças”...